Governo Bolsonaro teve mais MPs que seus antecessores

Foto de uma caneta sobre um documento, com o seguinte texto: Governo Bolsonaro foi recorde em medidas provisórias

Nes­te ano, Jair Bol­so­na­ro encer­ra­rá seu man­da­to com a mar­ca de ter sido um dos pre­si­den­tes que mais usou a cane­ta para legis­lar. Segun­do um levan­ta­men­to do Ins­ti­tu­to Bra­si­lei­ro de Pla­ne­ja­men­to e Tri­bu­ta­ção (IBPT), Bol­so­na­ro edi­tou qua­se 70% mais medi­das pro­vi­só­ri­as, por ano, que seus ante­ces­so­res: Dil­ma Rous­seff e Michel Temer.

Tra­ta-se de um estu­do anu­al do IBPT, que ava­lia a quan­ti­da­de e nor­mas cri­a­das no país des­de que a Cons­ti­tui­ção Fede­ral foi pro­mul­ga­da (1988). De lá para cá, 7,1 milhões de leis, decre­tos e por­ta­ri­as foram cri­a­dos, nas esfe­ras muni­ci­pal, esta­du­al e fede­ral, o que equi­va­le­ria a 829 novas nor­mas a cada dia útil.

Só sobre tri­bu­ta­ção são 4.869 em vigor atu­al­men­te (54.679 arti­gos, 127.402 pará­gra­fos, 407.358 inci­sos e 53.585 alí­ne­as). Se impres­sa em for­ma­to A4, essa quan­ti­da­de seria sufi­ci­en­te para ocu­par as pis­tas de ida e de vol­ta da Ave­ni­da Pau­lis­ta, de um extre­mo ao outro.

 

MPs durante o governo Bolsonaro

 

Segun­do o estu­do do IBPT, 2022 foi o ano com o mai­or volu­me de leis com­ple­men­ta­res e ordi­ná­ri­as pelo Con­gres­so Fede­ral: 259. Foi, tam­bém, o segun­do ano no qual o pre­si­den­te da Repú­bli­ca publi­cou mais medi­das pro­vi­só­ri­as (67). O mai­or foi 2020, tam­bém sob o gover­no de Bol­so­na­ro, quan­do foram edi­ta­das 108 MPs.

O recor­te refe­ren­te às medi­das pro­vi­só­ri­as, no estu­do do IBPT, vem sen­do fei­to des­de 2010, últi­mo ano do segun­do man­da­to de Luiz Iná­cio Lula da Sil­va, quan­do as elei­ções leva­ram a ex-pre­si­den­te Dil­ma Rous­seff à pre­si­dên­cia. Naque­le ano de 2010, foram publi­ca­das 59 MPs.

Nos gover­nos Dil­ma-Temer, entre 2011 e 2018, foram edi­ta­das 338 medi­das pro­vi­só­ri­as — uma média anu­al, por­tan­to, de 42 nor­mas. Em ape­nas 4 anos de gover­no Bol­so­na­ro, foram edi­ta­das 248 MPs (uma média de 71 por ano).

 

Medidas provisórias sobre questões fiscais tiveram destaque

 

No estu­do do IBPT, há um recor­te sobre a quan­ti­da­de de nor­mas tri­bu­tá­ri­as. De todas 284 medi­das pro­vi­só­ri­as edi­ta­das na ges­tão Bol­so­na­ro, 28 delas — cer­ca de 10% — tra­tam de temas fiscais.

Foi por meio de uma MP, por exem­plo, que o gover­no fez ajus­tes na tri­bu­ta­ção da comer­ci­a­li­za­ção de eta­nol para via­bi­li­zar a ven­da dire­ta dos pro­du­to­res aos pos­tos de com­bus­tí­veis, sem pas­sar pelas distribuidoras.

Tam­bém por MP, duran­te o mês de setem­bro, o gover­no redu­ziu o Impos­to de Ren­da de ope­ra­ções envol­ven­do gas­tos em via­gens inter­na­ci­o­nais e inves­ti­men­tos estrangeiros.

Uma das mais polê­mi­cas foi a MP 1.118, publi­ca­da no dia 17 de maio, que alte­rou a Lei Com­ple­men­tar nº192, do mês de mar­ço. Essa lei zerou as alí­quo­tas de PIS e Cofins sobre os com­bus­tí­veis até o fim do ano e garan­tiu o direi­to a cré­di­to para toda a cadeia: pro­du­to­res, reven­de­do­res e compradores.

A MP 1.118 alte­rou a lei impe­din­do o com­pra­dor de usar os cré­di­tos. A con­sequên­cia dis­so é que se a redu­ção do tri­bu­to não fos­se repas­sa­do pelo pro­du­tor ou reven­de­dor no pre­ço e o con­su­mi­dor não pudes­se tomar cré­di­to, ele teria, na prá­ti­ca, um aumen­to de cus­to. E, segun­do os advo­ga­dos, era isso que esta­va acontecendo.

O impas­se se encer­rou com a edi­ção de outra lei com­ple­men­tar, a nº194, do mês de junho, que res­ta­be­le­ceu o direi­to aos cré­di­tos de PIS e Cofins aos con­su­mi­do­res de óleo diesel.

 

O que são as medidas provisórias (MPs)?

 

Medi­das pro­vi­só­ri­as são nor­mas com for­ça de lei e podem ser usa­das pelo pre­si­den­te da Repú­bli­ca para ques­tões rele­van­tes e urgen­tes. Entram em vigor ime­di­a­ta­men­te, per­den­do a efi­cá­cia se não forem apre­ci­a­das pelo Con­gres­so Naci­o­nal em até 120 dias.

Esse é o úni­co ins­tru­men­to que per­mi­te ao pre­si­den­te tra­tar de novos temas legis­la­ti­vos que não tenham ain­da sido deli­be­ra­dos ante­ri­or­men­te pelos par­la­men­ta­res. Ao con­trá­rio do decre­to pre­si­den­ci­al, que tem a fun­ção ape­nas de regu­la­men­tar algo que já tenha sido deli­be­ra­do pelo Legislativo.

Um levan­ta­men­to rea­li­za­do pela revis­ta Valor, com base em infor­ma­ções do Con­gres­so, indi­ca que Jair Bol­so­na­ro con­se­guiu empla­car a mai­o­ria das medi­das pro­vi­só­ri­as que edi­tou nes­te últi­mo ano. Foram con­ver­ti­das em lei 38 das 67 nor­mas cri­a­das entre outu­bro de 2021 e novem­bro de 2022. Oito tive­ram a vigên­cia encer­ra­da e 21 ain­da estão em tramitação.

“Medi­da pro­vi­só­ria é um ins­tru­men­to pre­vis­to na Cons­ti­tui­ção Fede­ral, mas não sig­ni­fi­ca que o seu uso seja neces­sa­ri­a­men­te líci­to. Tem que se ana­li­sar o con­teú­do”, afir­ma Geor­ges Abboud, sócio do War­de Advo­ga­dos e pro­fes­sor de Direi­to Cons­ti­tu­ci­o­nal da PUC-SP e do IDP.

O espe­ci­a­lis­ta cha­ma a aten­ção que é mui­to mais fácil aten­der von­ta­des espe­cí­fi­cas de deter­mi­na­dos seg­men­tos soci­ais, polí­ti­cos e econô­mi­cos por MP do que tra­ba­lhar por um con­sen­so no Congresso:

“A medi­da pro­vi­só­ria não tem opo­si­ção. Se con­se­gue fazer um mon­te de medi­das popu­lis­tas. Até serem cor­ri­gi­das ou repa­ra­das pelo flu­xo natu­ral do sis­te­ma, os fins alme­ja­dos são atin­gi­dos”, frisa.

Para Rapha­el Cit­ta­di­no, pre­si­den­te do IELP, o exces­so de MPs é um sím­bo­lo da con­fu­são de papéis que exis­te hoje entre os pode­res Exe­cu­ti­vo e Legislativo:

“Temas impor­tan­tes da agen­da soci­al estão sen­do edi­ta­dos por medi­das pro­vi­só­ri­as por­que o Par­la­men­to está cui­dan­do do orça­men­to e o  Exe­cu­ti­vo está cui­dan­do de legis­lar”, afirma.

O espe­ci­a­lis­ta con­si­de­ra que nes­se mode­lo, ambos aca­bam per­den­do papel de con­tro­le um sobre o outro. “Exis­tem três pode­res e só um está exer­cen­do algum con­tro­le sobre os outros, o Judi­ciá­rio. Por isso, na minha opi­nião, essa car­ga pode dar a impres­são de que o Judi­ciá­rio está extra­po­lan­do limites”.

 

FONTE: REVISTA VALOR

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