IELP NA MÍDIA | CPI pode convocar presidente a depor? Entenda os poderes e limitações jurídicas da comissão

Veja per­gun­tas e res­pos­tas sobre o limi­te de atu­a­ção do inqué­ri­to no Senado

Rela­tor da CPI da Covid, o sena­dor Renan Calhei­ros (MDB-AL) afir­mou, no sába­do, 8, que o pre­si­den­te Jair Bol­so­na­ro pode ser res­pon­sa­bi­li­za­do caso a CPI com­pro­ve que o che­fe do Exe­cu­ti­vo con­tri­buiu para o agra­va­men­to da pan­de­mia. O ex-minis­tro da Saú­de Edu­ar­do Pazu­el­lo tam­bém está na mira dos inte­gran­tes da comis­são — ele se esqui­vou de pres­tar depoi­men­to na sema­na pas­sa­da ale­gan­do sus­pei­ta de infec­ção com o coro­na­ví­rus. Por sua vez, o ex-secre­tá­rio de Comu­ni­ca­ção Soci­al da Pre­si­dên­cia Fábio Wajn­gar­ten foi ame­a­ça­do de ser pre­so por fal­so tes­te­mu­nho ao pres­tar depoi­men­to à comis­são. Afi­nal, qual os pode­res de uma CPI?

Veja, abai­xo, per­gun­tas e res­pos­tas sobre o limi­te de atu­a­ção do inqué­ri­to no Senado.

Pazu­el­lo pode se recu­sar a com­pa­re­cer à CPI?
Como foi con­vo­ca­do na con­di­ção de tes­te­mu­nha, Pazu­el­lo não pode se negar a depor. A CPI é seme­lhan­te a um inqué­ri­to poli­ci­al; por isso, o ex-minis­tro da Saú­de tem a obri­ga­to­ri­e­da­de de com­pa­re­cer. “A tes­te­mu­nha não pode fal­tar”, expli­ca o advo­ga­do João Pau­lo Mar­ti­nel­li, pro­fes­sor da IBMEC-SP. “Ela está sub­me­ti­da ao cri­me de fal­so tes­te­mu­nho caso não com­pa­re­ça e não jus­ti­fi­que a ausên­cia. Quan­do esti­ver pre­sen­te, não pode ficar cala­da e não pode mentir.”

Mar­ti­nel­li lem­bra, no entan­to, que Pazu­el­lo tem o direi­to de não pro­du­zir pro­vas con­tra si mes­mo. “O que o STF tem como pre­ce­den­te é que a tes­te­mu­nha é obri­ga­da a com­pa­re­cer, mas se per­gun­tas forem fei­tas que podem com­pro­me­ter, a tes­te­mu­nha pode per­ma­ne­cer em silêncio”.

O gover­no quer garan­tir o direi­to de Pazu­el­lo ficar cala­do e não res­pon­der a per­gun­tas de sena­do­res. Com o aval do Pla­nal­to, a Advo­ca­cia-Geral da União (AGU) pre­pa­ra um habe­as cor­pus para ser apre­sen­ta­do ao Supre­mo Tri­bu­nal Fede­ral (STF). Como reve­lou o Esta­dão, esta é a pri­mei­ra vez que a AGU des­lo­ca uma equi­pe para ori­en­tar o depoi­men­to de um ex-ministro.

A situ­a­ção muda de figu­ra se o mili­tar for con­vo­ca­do como inves­ti­ga­do. Essa con­vo­ca­ção pode­ria ser fei­ta a par­tir do momen­to em que os inte­gran­tes da comis­são par­la­men­tar deci­dem que há fatos con­cre­tos sufi­ci­en­tes para inves­ti­gá-lo. “Nes­se caso, ele não pre­ci­sa­ria ir, por­que tem direi­to ao silên­cio e por­que não pre­ci­sa pro­du­zir pro­vas con­tra si mes­mo”, expli­ca o professor.

O que acon­te­ce se Pazu­el­lo fal­tar à CPI?
Na sema­na pas­sa­da, sena­do­res inte­gran­tes da comis­são dis­cu­ti­ram a pos­si­bi­li­da­de de fazer com que Pazu­el­lo seja alvo de uma con­du­ção coer­ci­ti­va. Isso ocor­reu depois que o Esta­dão reve­lou que o ex-minis­tro rece­beu a visi­ta de Onyx Loren­zo­ni, mes­mo ten­do ale­ga­do estar com sus­pei­ta de covid-19 para não depor na CPI.

A advo­ga­da cons­ti­tu­ci­o­na­lis­ta Vera Che­min expli­ca que o ins­tru­men­to de con­du­ção coer­ci­ti­va cau­sou polê­mi­ca na épo­ca da Ope­ra­ção Lava Jato, o que gerou um enten­di­men­to do Supre­mo Tri­bu­nal Fede­ral (STF) de que ele só pode­ria ser apli­ca­do quan­do a pes­soa for inti­ma­da, mas não comparecer.

“Como a CPI tem pode­res de inves­ti­ga­ção simi­la­res a de um juiz, caso Pazu­el­lo não aten­da à soli­ci­ta­ção ele pos­te­ri­or­men­te tam­bém pode­ria ser denun­ci­a­do por um cri­me de deso­be­di­ên­cia civil”, diz Vera.

Mar­ti­nel­li pon­tua que Pazu­el­lo só pode con­ti­nu­ar a adi­ar seu depoi­men­to caso apre­sen­te uma jus­ti­fi­ca­ti­va ver­da­dei­ra: “Se o moti­vo para não com­pa­re­cer não for ver­da­dei­ro, ele pode por exem­plo res­pon­der por pro­du­zir docu­men­to fal­so, se apre­sen­tar um ates­ta­do médi­co fal­so. Ele pode até mes­mo vir a ser con­du­zi­do coercitivamente”.

E o pre­si­den­te Bol­so­na­ro, pode ser obri­ga­do a depor?
Há diver­gên­cia nes­se pon­to, pois essa situ­a­ção não está expli­ci­ta­da na Cons­ti­tui­ção ou no Regi­men­to Inter­no no Sena­do. Vera Che­min lem­bra que, no inqué­ri­to sobre a pos­sí­vel inter­fe­rên­cia de Bol­so­na­ro na Polí­cia Fede­ral, que tra­mi­ta no STF, o minis­tro Cel­so de Mel­lo deter­mi­nou que o pre­si­den­te fizes­se um depoi­men­to pre­sen­ci­al. A ques­tão ain­da não foi deci­di­da pelo ple­ná­rio da Corte.

Por outro lado, o pro­fes­sor Mar­ti­nel­li comen­ta que, em geral, há um enten­di­men­to de que depu­ta­dos e sena­do­res, repre­sen­tan­tes do Poder Legis­la­ti­vo, não pode­ri­am obri­gar o pre­si­den­te da Repú­bli­ca, che­fe do Poder Exe­cu­ti­vo, a depor. “Seria intro­mis­são de um Poder em outro, e isso não é per­mi­ti­do. Mas não é uma proi­bi­ção expres­sa”, expli­ca o advo­ga­do. “Ele pode ser con­vi­da­do, pode ser inves­ti­ga­do, mas não é obri­ga­do a comparecer”.

Uma jus­ti­fi­ca­ti­va seme­lhan­te pode­ria ser­vir a gover­na­do­res con­vi­da­dos deci­di­rem não com­pa­re­cer. Impor­tan­te lem­brar que a comis­são do Sena­do só pode inves­ti­gar fatos rela­ci­o­na­dos à União. “Os gover­na­do­res podem argu­men­tar que só res­pon­dem às assem­blei­as legis­la­ti­vas dos seus Esta­dos”, diz Martinelli.

Os sena­do­res têm poder para que­brar sigi­los fis­cal ou telefô­ni­co dos investigados?
Sim, os sena­do­res atu­am como “juí­zes” em uma CPI. Podem inqui­rir tes­te­mu­nhas, ouvir indi­ci­a­dos, requi­si­tar infor­ma­ções ofi­ci­ais e ain­da pedir ins­pe­ções do Tri­bu­nal de Con­tas da União.

Que tipo de mate­ri­al pode ser colhi­do ao lon­go da investigação?
Assim como podem con­vo­car auto­ri­da­des, a CPI pode requi­si­tar docu­men­tos e deter­mi­nar a rea­li­za­ção de dili­gên­ci­as, como visi­tas a gabi­ne­tes, uni­da­des de saú­de ou escri­tó­ri­os de fornecedores.

Wajn­gar­ten pode ser pre­so por fal­so tes­te­mu­nho? Os sena­do­res podem man­dar pren­der sus­pei­tos ou abrir processos?
Em uma ses­são ten­sa, o rela­tor da CPI da Covid, o sena­dor Renan Calhei­ros (MDB-AL), che­gou a pedir a pri­são do ex-secre­tá­rio de Comu­ni­ca­ção da Pre­si­dên­cia Fábio Wajn­gar­ten. No entan­to, o pre­si­den­te da CPI da Covid, sena­dor Omar Aziz, pre­fe­riu reme­ter depoi­men­to para o Minis­té­rio Públi­co para apu­rar fal­so tes­te­mu­nho. Uma CPI pode deter­mi­nar pri­sões em fla­gran­te, no caso de fal­so tes­te­mu­nho, mas não em quais­quer cir­cuns­tân­ci­as. “É mui­to difí­cil che­gar nes­se pon­to”, afir­ma o pre­si­den­te do Ins­ti­tu­to de Estu­dos Legis­la­ti­vos e Polí­ti­cas Públi­cas (IELP), Rapha­el Cit­ta­di­no. “A tes­te­mu­nha sem­pre pode pedir um habe­as corpus.”

A legis­la­ção pre­vê que pes­so­as podem ser con­vo­ca­das a ir a uma CPI e, como tes­te­mu­nhas, não podem nem men­tir nem se calar. Entre­tan­to, a Cons­ti­tui­ção tam­bém tem o prin­cí­pio da autoin­cri­mi­na­ção: nenhum cida­dão é obri­ga­do a pro­du­zir pro­vas con­tra si.

Em 1999, duran­te a CPI dos Ban­cos, o ex-pre­si­den­te do Ban­co Cen­tral Fran­cis­co Lopes se recu­sou a assi­nar ter­mo em que só diria a ver­da­de. Os par­la­men­ta­res, então, enten­de­ram que ele esta­va come­ten­do os cri­mes de deso­be­di­ên­cia e desa­ca­to, e ele foi leva­do à Polí­cia Federal.

Que resul­ta­do pode ter a CPI?
Após apro­va­do inter­na­men­te na comis­são, o rela­tó­rio final da CPI é envi­a­do à Mesa Dire­to­ra para conhe­ci­men­to do ple­ná­rio. A depen­der da con­clu­são dos tra­ba­lhos, o docu­men­to pode gerar um pro­je­to de lei e até mes­mo ser reme­ti­do ao Minis­té­rio Públi­co com pedi­do de res­pon­sa­bi­li­za­ção civil e cri­mi­nal dos infratores.

Se a CPI deci­dir pela res­pon­sa­bi­li­za­ção de Pazu­el­lo, qual o cami­nho a seguir?
Como dito ante­ri­or­men­te, a comis­são tem ape­nas o papel de inves­ti­gar. “O que for colhi­do de pro­vas, é enca­mi­nha­do para as auto­ri­da­des que têm com­pe­tên­cia para as pro­vi­dên­ci­as futu­ras”, expli­ca Mar­ti­nel­li. “Se hou­ver indí­cio de cri­me, tem que enca­mi­nhar para o Minis­té­rio Públi­co. A CPI não pode denun­ci­ar para o Poder Judi­ciá­rio, por­que isso é com­pe­tên­cia do MP”.

Se, futu­ra­men­te, o MP deci­dir denun­ci­ar o ex-minis­tro, como ele não ocu­pa mais car­go no gover­no res­pon­de­ria na Jus­ti­ça comum — e não na mili­tar. “Ele esta­va atu­an­do como minis­tro, civil”, diz Vera. “Não tem rela­ção com a atu­a­ção dele como mili­tar. E como ele não tem mais car­go, não res­pon­de­ria por cri­me de res­pon­sa­bi­li­da­de, mas sim cri­me comum”, diz Vera.

E no caso de Bol­so­na­ro, o que acon­te­ce­ria se a CPI indi­cas­se res­pon­sa­bi­li­da­de do presidente?
Nes­sa situ­a­ção, é a Pro­cu­ra­do­ria-Geral da Repú­bli­ca que tem a com­pe­tên­cia para ofe­re­cer uma denún­cia con­tra o pre­si­den­te. O futu­ro de Bol­so­na­ro pode­ria ser deci­di­do em duas esfe­ras: no Judi­ciá­rio e no Legis­la­ti­vo. Caso seja acu­sa­do de um cri­me comum, o che­fe do Exe­cu­ti­vo seria jul­ga­do no STF. E se pesar uma acu­sa­ção de cri­me de res­pon­sa­bi­li­da­de, ele pode­ria ser cas­sa­do pela Câma­ra dos Deputados.

“O mes­mo fato pode ser jul­ga­do pelo Legis­la­ti­vo e pelo Judi­ciá­rio”, expli­ca Mari­nel­li. “Como no caso do Col­lor, que sofreu impe­a­ch­ment mas foi absol­vi­do na Jus­ti­ça. E no caso de Dil­ma, que foi cas­sa­da mas nem foi indiciada”

Aces­se a repor­ta­gem em: https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,cpi-pode-convocar-presidente-a-depor-entenda-os-poderes-e-limitacoes-juridicas-da-comissao,70003713417

 

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